A Árvore da Vida (2011) - Análise - A fascinante complexidade de Terrence Malick!

 


Por: Rudnei Ferreira 


Falar de um diretor como Terrence Malick não é uma tarefa fácil. Conhecido pelos seus filmes complexos e cheios de simbologia e metáforas, o cineasta americano é um gosto adquirido, afinal, seu público se resume entre aqueles que veneram as suas obras cinematográficas e aqueles que não suportam toda a complexidade que ele insere em seus longas. Independente de qual lado você esteja, é fato que o cineasta tem talento e criatividade ao criar suas obras. Confesso que conheci o trabalho de Malick depois de assistir ao longa ''Além da Linha Vermelha'', um ótimo épico dramático de Guerra cheio de reflexão e filosofia. Desde então, a obra do diretor tem atraído minha atenção.

Com ''A Árvore da Vida'', mais uma vez o diretor e roteirista nos entrega um filme complexo, filosófico, reflexivo e cheio de metáforas e simbologia. Indicado a três Oscar, incluindo o de ''Melhor Filme'', o longa de Malick chegou a vencer a Palma de Ouro no Festival Cannes, sob uma multidão que se dividiu entre aplausos e vaias. Apesar das análises divididas entre a crítica e o público no início, hoje o filme é amplamente elogiando por ambos, sendo considerado por muitos uma das obras-primas do diretor. O meu consenso é que ''A Arvore da Vida'' decididamente está longe de ser um filme para agradar todo mundo, o que não vai, mas para esse que vos escreve, Terrence Malick conseguiu a proeza de conduzir mais uma obra marcante, interessante e de muita qualidade, cuja a experiência de assisti-la merece ser vivida. 





 O longa nos conta a história e os dramas de uma família americana dos anos 50. O Senhor e senhora O'Brian (Brad Pitt e Jessica Chastain) criam através do amor e da educação dura e rígida os seus três filhos (Tye Sheridan, Hunter McCracken e Laramie Eppler). Depois de perder um deles, o casal, especialmente a mãe, começam a questionar Deus e o universo sobre o porque do acontecimento, o que acaba despertando perguntas e reflexões. 

Como era de se esperar, Terrence Malick nos oferece perguntas mas não as respostas e muito menos soluções em seu filme. Ele convida o espectador a mergulhar em sua viagem estranha, porém fascinante, desafiando quem assiste a tirar as suas próprias conclusões ao decifrar os enigmas, simbologias e metáforas que ele apresenta na tela. ''A Arvore da Vida'' não é um filme qualquer. Trata-se de um grande quebra-cabeça cinematográfico, onde é preciso juntar as peças para entender seu conteúdo e principalmente sua mensagem. E esse quebra-cabeça exige total paciência e atenção do espectador para que o seu conteúdo faça algum sentido, ou não. O público se sente desde a primeira a última cena instigado a tentar entender o que está acontecendo, já que o roteiro assinado pelo próprio Malick é bem complexo e imprevisível. Embora seja sim bem complexo, existe um sentido para tudo o que estamos vendo acontecer, mas o sentido de tudo isso depende da interpretação que cada um vai dar ao longa ao final da sua projeção. Alguns vão assistir e achar que tudo não passa de uma verdadeira loucura saída da mente do diretor e roteirista, já outros, como foi o meu caso, irá encontrar reflexões profundas em seu conteúdo. E não existe um certo ou errado quando o assunto é expor suas teorias e suposições a respeito do filme, afinal, a intenção de Malick foi justamente criar algo que de uma maneira ou outra atinja e cause impacto naqueles que mergulharem em sua fascinante e complexa viagem. Não é cinema pipoca, nem muito menos um entretenimento fácil. Afinal, o cinema de Terrence Malick é feito para se pensar, e pensar muito. Por isso é um gosto adquirido. 






E o cineasta desenvolve sua história de maneira não linear, já que ele simplesmente insere na tela várias ideias e conceitos. Começa com um drama familiar envolvendo a família protagonista que se vê obrigada a passar por uma tragédia pessoal. Logo em seguida, fala sobre a criação do universo através da teoria do Big Bang, que segundo a ciência foi a grande responsável pelo nascimento da vida, até mesmo no nosso planeta azul. Em seguida, um retorno ao passado conta toda a trajetória dessa família americana antes da sua perda. Como podem ver, Malick conta tudo isso como uma maneira de mostrar as suas reais intenções, fazendo com que todos esses acontecimentos se conectem de alguma maneira. E como já foi mencionado, cabe ao expectador fazer essas conexões para entender a grande mensagem por trás de tudo. Ao meu ver, ou seja, na minha interpretação, esse paralelo entre a família e tudo que deu origem a vida no universo servem para que o espectador possa analisar e refletir sobre o que é a vida e principalmente sobre qual é o papel do ser humano diante dela. Inclusive, o próprio roteiro faz um interessante e oportuno estudo de personagens e também da própria natureza humana, com seus vícios, ações questionáveis e sentimentos típicos como inveja, cobiça, ambição, amor, desprezo, raiva e por ai vai. Tudo isso gera causas e consequências como a alegria das boas lembranças de determinados acontecimentos, mas também tristeza e arrependimento, onde algumas ações, mesmo que se tente, jamais podem ser desfeitas, chegando ao ponto de ser tarde demais. E é pensando nisso que o roteiro também adota tons religiosos, como o fato de que em alguns momentos, é até comum a humanidade testar a sua fé se pegando questionando o próprio universo e até mesmo Deus do porque certas coisa acontecem na vida. Castigo divino? tudo está ou não escrito para acontecer da maneira que acontece? O fato é que nada é por acaso e mesmo que não seja possível entender, aquele momento teve um propósito para acontecer.  A ''arvore da vida'' tem a ver com os capítulos que  escrevemos ao longo de toda a nossa trajetória e como aproveitamos e vivemos cada passagem e escolha da nossa vida, sejam esses momentos bons ou ruins, pois no fim, tudo é uma experiência que se guarda para sempre. Enfim, a história contada por Malick é sobre a arte de viver, mas cada um é livre para interpretar o longa a sua maneira. 

O estilo único da direção é convidativo, já que até a forma como Malick dirige e utiliza a linguagem cinematográfica é extremamente importante para contar a história com todo o seu poder manipulativo e desafiador. Sua câmera está sempre em constante atividade, se movimentando ao redor dos personagens, os seguindo a todo instante. Há momentos onde o diretor simplesmente joga a câmera em cima dos atores, captando cada expressão e movimentação deles. Chama muita a atenção também a excepcional montagem, cujos cortes bruscos e frenéticos, porém precisos, refletem o perfeccionismo do diretor, que se preocupa com os detalhes presentes nos ambientes e cenários. Os efeitos visuais são todos feitos de maneira prática, onde apenas algumas cenas contam com efeitos digitais, especialmente nas sequências psicodélicas e cheias de cores envolvendo a criação do universo, que muito faz lembrar aquelas imagens igualmente fantásticas vistas no clássico ''2001: Uma Odisseia no Espaço'' de Stanley Kubrick. Nesse ponto, fica difícil não comparar as duas obras.  A trilha sonora, edição e mixagem de som e fotografia são igualmente espetaculares e se casam perfeitamente com os demais elementos audiovisuais. Tudo isso serve para dar ênfase e contribuir com toda a filosofia reflexiva proposta por Malick. 

 





O elenco conta com performances profundas e complexas, principalmente de Brad Pitt e Jessica Chastain. Ele impressiona e convence como um pai duro e frio, que educa seus filhos de maneira rígida. Já ela encanta por exalar muita doçura, carinho, amor e paz em relação a eles. Ou seja, um é o oposto do outro. Extremamente talentosos, tanto Brad quanto Jessica dão um show, com atuações competentes que dão muitas camadas e profundidade a esse casal cheio de dramas e conflitos. O veterano Sean Penn aparece bem pouco, mas a sua participação não passa despercebida. Isso porque o ator sempre teve muita presença em cena e aqui, não seria diferente. Já as crianças vividas por Tye Sheridan, Hunter McCracken e Laramie Epper transmitem todos os medos, desejos e angústias de seus personagens, com atuações muito honestas e operantes. Muito mais do que levantar reflexões filosóficas, esse talentoso elenco contribui para um bom estudo de personagens através do drama familiar e seus conflitos pessoais. 

''A Árvore da Vida'' é daquele tipo de filme muito bem vindo que gera intensas discussões e reflexões sobre o significado em torno do seu complexo conteúdo. Terrence Malick nos proporciona uma experiência cinematográfica inteligente, manipuladora, inesperada, reflexiva e filosófica, tudo através de um bom roteiro simbólico e cheio de muitas camadas que exigem do público paciência e comprometimento. Não há dúvidas de que estamos diante de um filme controverso que decididamente não foi feito para agradar a todo mundo. Mas para quem der uma chance, irá se deparar com uma das experiências fílmicas mais diferenciadas de toda a história do cinema, como só Terrence Malick e toda a sua fascinante complexidade é capaz de proporcionar. Para o bem ou para o mal, é muito difícil sair indiferente ao final da sessão. 

Nota: ★★★★★★★★★ 9



A ÁRVORE DA VIDA (THE TREE OF LIFE - 2011) - Drama, 138 minutos. ESCRITO E DIRIGIDO POR: Terrence Malick. ELENCO: Brad Pitt, Jessica Chastain, Sean Penn, Tye Sheridan, Hunter McCracken, Laramie Eppler, Fiona Shaw. CLASSIFICAÇÃO: 10 anos. NOTA NO ROTTEN TOMATOES: 84%



CURIOSIDADES: 

  • Originalmente, o ator Heath Ledger (Batman: O Cavaleiro das Trevas) havia sido o escolhido para interpretar o senhor O'Brian. Porém, devido a sua morte em 2008, Brad Pitt ficou em seu lugar. 
  • Mel Gibson e Colin Farrell também tiveram os seus nomes envolvidos para o filme, mas ficaram de fora. 
  • O diretor e roteirista Terrence Malick teve a ideia para o filme durante os anos 70, antes de dirigir o seu filme Cinzas do Paraíso. Porém, ele abandonou o projeto durante um longo tempo até finalmente tomá-lo durante os anos 2000. 
  • Para desenvolver as cenas do espaço sideral durante a sequência da criação, o diretor chegou a consultar a NASA para ter maior precisão. 
  • ''A Árvore da Vida'' recebeu 3 indicações ao Oscar (Melhor Filme, Melhor Diretor - Terrence  Malick e Melhor Fotografia). 
  • O filme foi o grande vencedor do prêmio Palma de Ouro no Festival de Cannes

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