Lúcifer (Original Netflix) - As irresistíveis aventuras do Diabo!




Por: Rudnei Ferreira 


Todos já conhecemos o personagem, não é mesmo? Presente no imaginário popular, o Diabo é uma das figuras mais complexas, assustadoras e interessantes da Bíblia, junto com Jesus Cristo, o próprio Deus e tantos outros. De acordo com o livro sagrado do cristianismo, o Diabo, antes conhecido como Lúcifer Estrela da Manhã, era um dos melhores anjos de Deus no paraíso. Mas por achar que estava acima do criador, foi expulso do céu, tornando-se um anjo caído e sendo obrigado a governar o inferno por toda a eternidade. E assim como é em relação á Deus, muitos tem fé e devoção pela figura do demônio, acreditando que o próprio influencia a humanidade com suas maquinações perversas. 

Presente não apenas nas sagradas escrituras, Lúcifer acabou se tornando um personagem marcante em outras mídias como livros, peças de teatro, histórias para a televisão e também para o cinema. E em todas essas mídias, suas representações são em sua maioria muito marcantes. Como esquecer, por exemplo, da sua sinistra versão nas telas do cinema no clássico "Coração Satânico" de 1987 vivido por um jovem Robert De Niro. Outros grandes atores como Al Pacino e Peter Stormare também já representaram o senhor do inferno em bons filmes como "Advogado do Diabo"(1997) e "Constantine"(2005) respectivamente. 

Além disso, o Estrela da Manhã deu as caras em jogos de videogame, animações e também nos quadrinhos. Criado em 1989 pelo britânico Neil Gaiman para a revista "Sandman", que por si leva o selo Vertigo da DC, Lúcifer Morningstar foi colocado no mesmo universo de outros personagens como Batman Constantine. O sucesso nas páginas Fizeram com que o personagem fosse para a TV na série "Lúcifer", uma produção em parceria com a Fox e a Warner Bros Television, levemente baseado na obra de Neil Gaiman. Protagonizada pelo charmoso e carismático ator inglês Tom Ellis, a produção teve duas temporadas de sucesso muito elogiadas e uma terceira temporada que dividiu as opiniões do público e da crítica. Isso fez com que a série fosse cancelada sem um final conclusivo, o que provocou revolta e protestos entre os fãs mais fervorosos. Uma forte campanha foi feita para que a Netflix, atualmente uma das maiores na indústria do entretenimento no mercado de Streaming, resgatasse a série e produzisse novos episódios. As preces foram atendidas e a plataforma vermelha investiu e concordou em das segmento as aventuras do rei do inferno na terra. Entre polêmicas e altos e baixos, "Lúcifer" é no geral uma das séries mais legais que já conferi. Portanto, vale a pena comentar sobre ela aqui. 







A série gira em torno de Lúcifer Morningstar (Tom Ellis). Cansado de ser o governante do inferno, ele decide vir para a terra, onde se torna o dono de uma luxuosa boate no centro de Los Angeles e passa a desfrutar dos prazeres da vida. Depois que uma amiga é assassinada, seus caminhos se cruzam com os da experiente detetive da polícia Chloe Decker (Lauren German), onde ele recorre a sua ajuda para solucionar os mistérios em torno da morte. Contudo, nasce a partir daí uma amizade entre eles, fazendo com que Lúcifer e Chloe se tornem parceiros de investigação criminal. Enquanto isso, o surgimento do seu irmão Amenadiel (D.B Woodside), entre outros desafios, desencadeiam uma sucessão de acontecimentos marcantes e inesperados na vida do senhor das trevas, sejam eles celestiais ou não. 

Embora seja uma adaptação dos quadrinhos criados por Neil Gaiman, "Lúcifer" traz muitas diferenças em relação ao seu material original. Enquanto nos quadrinhos da DC o personagem se assemelha bastante com a figura do Diabo descrita na Bíblia, com uma trama mais sombria e seria,  na série da Netflix criada por Tom Kapinos, ele e suas aventuras variam de tom, indo desde a comédia até a ação e o drama. Por conta dessas mudanças de ritmo e estilo narrativo e visual, "Lúcifer" causou e causa polêmica entre os religiosos que alegam vorazmente que a série deturpa a Bíblia Sagrada com seus elementos fantasiosos em cima dos religiosos e por querer passar a imagem de que o Diabo é um ser bonzinho e agradável. Se formos parar para analisar do ponto de vista religioso, a série de fato comete muitos exageros e deslizes em relação ao que as sagradas escrituras nos contam. Vários personagens e elementos religiosos sofreram alterações em prol do entretenimento e como forma de cativar o público telespectador. Contudo, analisando do lado crítico de alguém que apenas se interessa pela ficção, " Lúcifer" é um bom entretenimento que usa os elementos bíblicos para divertir e entreter, além de apresentar em sua narrativa assuntos sérios e bastante relevantes. 

Ao mesmo tempo que é fantasiosa, a produção traz ao longo dos seus episódios tramas de investigação policial muito boas. Sem contar que os seus roteiros trabalham com os mais variados assuntos sociais como racismo, culpa, redenção, abandono, representatividade, sexualidade, aceitação de diferenças, entre outros. Tudo através de um enredo criativo e inteligente que mantém o espectador curioso e interessado. Todos os personagens são relevantes para a história, desde o protagonista até os coadjuvantes. A história sabe equilibrar muito bem seus elementos, mantendo um bom ritmo e um clima agradável. 







Claro que por se tratar de uma série com 6 temporadas, ela não é perfeita. Entre os seus defeitos está o tom repetitivo dado as tramas policiais, mesmo que elas sejam legais, já que quase todos os episódios envolvem mais um caso criminal que precisa ser investigado. A partir da quinta temporada, o roteiro vai aos poucos deixando isso de lado, focando mais na  fantasia sobrenatural que já fazia parte do enredo desde o primeiro episódio. Mas até chegar a esse ponto, a sensação de mais do mesmo é recorrente. Isso sem contar que algumas tramas  envolvendo alguns personagens se tornam enfadonhas em certos momentos. Isso é notado principalmente na terceira temporada, a mais longa e mais fraca de todas, e ela se torna longa justamente por conta de vários acontecimentos que poderiam ter sido descartados. Felizmente, os realizadores vão corrigindo essas falhas nas temporadas seguintes, que já são sob o comando na Netflix. No geral, a série tem altos e baixos sim, contudo, a história chamativa e os personagens bem construídos fazem com que suas falhas sejam até relevantes. O bom humor, o suspense e a ação também se equilibram sem parecerem exagerado demais ou ausente demais. O resultado final é positivo, já que nós espectadores sempre nos sentimos incentivados a continuar acompanhando a série. Afinal, como era de se esperar, os episódios sempre se encerram com um gostinho de quero mais. 

Como bem sabemos, o orçamento de produção de uma série televisiva tende sempre a ser menor em comparação as grandes produções para o cinema. ''Lúcifer'' é mais um exemplo disso, já que fica perceptível, principalmente em suas três primeiras temporadas, que os seus custos de produção não chegam perto dos custos de um filme hollywoodiano. Felizmente, isso não é um problema, ao meu ver, já que em questões técnicas, a série é bem convincente. Os efeitos visuais são muito bons na medida do possível, assim como outros aspectos como o design de produção, figurinos e maquiagem. A partir da quarta temporada, quando a Netflix começou a produzir os episódios, é satisfatório de ver o quanto esses recursos audiovisuais foram evoluindo e ficando cada vez melhores, o que era de se esperar devido ao alto investimento que a plataforma de Streaming teve para com o projeto, tanto em questões de marketing quanto em questões orçamentais de produção. E graças a isso, todo o universo bíblico do protagonista nos convence ao ponto de acreditarmos que seres divinos e celestiais poderiam sim andar em meio a humanidade como se fossem mais um de nós. O enredo acertadamente transformam essas figuras bíblicas em criaturas mais humanizadas. E isso nos proporciona uma experiência polêmica, mas também curiosa, já que a série nos faz imaginar como seria se Deus, o Diabo, anjos e demônios agiriam se convivessem diariamente com a humanidade que os idolatram ou não. 







Sem tem uma coisa que faz essa série funcionar tão bem, nos mantendo interessados e investidos em suas 6 temporadas, é o seu talentosíssimo elenco, que como já foi citado, está muito bem e tem muito a oferecer. Como não poderia ser diferente, quem ganha todos os principais méritos e destaques é Tom Ellis, dando vida ao protagonista. Sua versão do Diabo aqui conserva e se inspira em algumas das melhores versões ficcionais dessa intrigante figura bíblica. Mas é o imenso talento e carisma do ator inglês que faz toda a diferença. Desde o primeiro episódio, Tom está extremamente a vontade no papel, encarnando o senhor do inferno com uma naturalidade impressionante, deixando mais do que claro a todo o momento que ele nasceu para interpretá-lo nessa história. A escolha do ator para viver o Lúcifer Morningstar da DC é mais do que acertada, já que o mesmo injeta altas doses de carisma e um bom humor ácido irresistível ao personagem, mas também se sai muito bem quando precisa protagonizar momentos mais tensos e dramáticos. Sua parceira de cena, a bela atriz norte americana Lauren German, possui química e ótimo desenvolvimento com ele. Desde o primeiro momento em que estão juntos já é previsível que eles formarão um par romântico ao longo da trama. E mesmo que o roteiro oscile as vezes nessa relação, o bom desenvolvimento da dupla é muito bom, fazendo de ambos um casal e tanto. O elenco de apoio é igualmente ótimo, onde se destacam o anjo Amenadiel de B.D Woodside, a doutora psicóloga Linda Martin de Rachel Harris, o carismático policial e ex marido de Chloe, Daniel Espinoza vivido por Kevin Alejandro, a divertida e rebelde demônio guardiã de Lúcifer, Mazikeen, interpretada por Lesley-Ann Brandit, a esperta e astuta filha de Chloe, Trixie, vivida pela atriz mirim Scarlett Stevez e a faladora, porém muito inteligente, investigadora científica Ella Lopez, vivida com muita graça por Aimee Garcia. Todos eles juntos protagonizam cenas divertidas, surpreendentes e emocionantes.   

Com 6 temporadas, ''Lúcifer'' se inicia muito bem, se desenvolve entre altos e baixos e conta com um final agridoce, mas bastante satisfatório e emocionante para a proposta da série. Embora polêmica em questões de adaptação e principalmente por apresentar elementos religiosos, sua trama envolvente, seus personagens muito bem desenvolvidos, suas qualidades técnicas, sua mistura de gêneros e temas e seu elenco extremamente talentoso são motivos mais do que suficientes para dar uma chance as irresistíveis aventuras do Diabo da DC. Assista de mente aberta e sem levar muito a sério e provavelmente você irá se divertir com essa ótima produção da Netflix. 

Nota: ★★★★★★★★★





LÚCIFER (ORIGINAL NETFLIX - 2016/2021) - CRIADA POR: Tom Kapinos. NÚMERO DE EPISÓDIOS: 93 episódios. NÚMERO DE TEMPORADAS: 6 Temporadas. DURAÇÃO POR EPISÓDIO: De 50 a 60 minutos. BASEADO NOS QUADRINHOS CRIADOS POR: Neil Gaiman. ELENCO: Tom Ellis, Lauren German, Lesley-Ann Brandt, Kevin Alejandro, D.B Woodside, Rachel Harris, Aimee Garcia, Scarlett Estevez, Tricia Helfer, Inbar Lavi, Tom Helling, Briana Hildebrand. CLASSIFICAÇÃO: 16 anos. NOTA NO ROTTEN TOMATOES: 88%



CURIOSIDADES: 

  • Antes de começar as gravações da série, o astro Tom Ellis tentou ensaiar um sotaque americano, já que o seu sotaque britânico era bem aparente. No entanto, a tentativa de disfarça-lo não deu certo. No final, o ator teve total liberdade para usar o seu sotaque original no protagonista. 
  • Antes mesmo de estrear na TV aberta dos Estados Unidos, a série causou polêmica entre um grupo cristão conservador que assinou uma petição pedindo para que o programa não fosse pro ar. A principal reclamação, entre tantas outras, era que a série estrelada por Tom Ellis deturpava a bíblia e retratava o Diabo como bonzinho. No total, mais de cinco mil pessoas assinaram o documento de censura, o que não resultou em nada. Pelo contrário, só fez aumentar a popularidade da série. 
  • Nos quadrinhos originais em que a série se baseia, é dito que Lúcifer foi inspirado no cantor David Bowie. Isso porque o seu criador, Neil Gaiman, é um grande fã do artista. 
  • Originalmente, seria a atriz Lina Esco que interpretaria a demônio Maze, porém, ela acabou sendo substituída por Lesley-Ann Brandt. Kevin Alejandro também foi o escolhido para substituir Nicholas Gonzales como o policial Daniel Espinoza. Gonzales até chegou a gravar o primeiro episódio da primeira temporada como o personagem, mas antes da estreia oficial teve todas as suas cenas regravados por Alejandro. 
  •  O personagem Lúcifer nunca é visto fumando ao longo da série, mesmo que ele acenda ou pegue um cigarro em cena. O motivo disso se deve ao fato de que os produtores evitaram incentivar o uso do objeto para que a série pudesse ser exibida na TV aberta americana. Mesmo depois que a Netflix passou a produzir os episódios a partir da quarta temporada, essa característica do personagem foi mantida. 
  • Já  por trás das câmeras, Tom Ellis é viciado em fumar e já admitiu em algumas entrevistas que precisa parar com o hábito do cigarro. 
  • Jesus Cristo é talvez o único personagem bíblico que não aparece e nem é mencionado ao longo das seis temporadas de ''Lúcifer''. 

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