Cisne Negro (2010) - Natalie Portman excepcional em um filme fantástico!
Por: Rudnei Ferreira
O cinema do cineasta americano Darren Aronofsky é cercado de psicologia, metáforas e muita simbologia. Seus filmes são grandes obras contemplativas e impactantes onde a maioria deles geram discussões e reflexões sobre o seu conteúdo. E o cara é muito bom: ''Mãe'', ''Réquiem Para um Sonho'', ''Fonte da Vida'', ''O Lutador'' e ''Noé'' são algumas das suas obras cinematográficas mais marcantes. Filmes inteligentes, muito bem produzidos e cheios de grandes atuações. Essas são algumas de suas marcas registradas, além, é claro, do conteúdo. Aronofsky é daqueles diretores que fazem parte do chamado grupo ''Ame ou odeie''. Embora os filmes citados acima sejam muito bons, eles com certeza dividiram, dividem ou dividirão muitas opiniões. Independente de tudo isso, na opinião pessoal deste que vos escreve, Darren Aronofsky é um baita diretor, cujo o talento e competência nos convida, através de suas obras, a mergulhar em universos complexos, controversos e fascinantes.
Lançado em 2010, o filme que será comentado aqui hoje está entre uma das melhores produções da sua filmografia. ''Cisne Negro'' é uma obra espetacular, desde a primeira até a última cena, e acerta em tudo o que se propõe a mostrar em cena, além de merecidamente premiar a talentosa Natalie Portman com o primeiro Oscar da sua carreira até agora.
A trama nos apresenta Nina (Natalie Portman), uma doce e jovem bailarina que é a grande escolhida para estrelar a nova versão da peça ''O Lago dos Cisne'' comandada pelo rigoroso Thomas Leroy (Vincent Cassel). O grande porém é que ele exige da sua escolhida talento e competência para encarnar nos palcos de uma só vez o Cisne Branco e o Cisne Negro, duas personalidades diferentes para uma mesma bailarina. Em seu desespero para obter o resultado desejado, Nina acaba ultrapassando todas as barreiras do possível e do aceitável para alcançar a perfeição, o que lhe causará consideráveis mudanças físicas e principalmente mentais.
Por se tratar de um filme que tem o balé como principal alegoria, o público masculino talvez pode achar que o longa de Darren Aronofsky foi feito exclusivamente para agradar as mulheres interessadas na dança. Se você é homem e até hoje não assistiu a essa obra extraordinária por achar isso, aqui vai um aviso: você nunca esteve tão errado em relação a um filme. Isso porquê ''Cisne Negro'' é muito mais do que uma simples história sobre uma companhia de balé. É um drama psicológico pesado, visceral, incômodo em alguns momentos e bastante surpreendente do início ao fim. Aronofsky, como faz na maioria de sua filmografia, nos entrega uma obra repleta de camadas e cheia de simbologia, mensagens ocultas e alegorias, tudo através de uma trama misteriosa e com vários tons. ''Cisne Negro'' fala sobre a obsessão compulsiva em agradar e alcançar a perfeição, ao ponto de se extrapolar todos os limites para chegar até esse objetivo. Não se contendo apenas nessa questão, o roteiro trabalha com outros assuntos como conflitos familiares e pessoais, frustrações, inveja, paranoia, ambição, abusos físicos e mentais, amadurecimento, autoconhecimento e autodescoberta. Uma coisa que essa história faz muito bem é plantar no espectador a semente da dúvida, que leva a se questionar sobre o que é real e o que é apenas imaginação, tudo através do olhar e do ponto de vista da protagonista Nina. Isso é brilhantemente bem orquestrado com um primor narrativo impressionante, capaz de deixar o público vidrado e completamente absorvido por cada detalhe apresentado na tela, sem jamais deixar o filme enfadonho e cansativo, muito pelo contrário. ''Cisne Negro'' oferece um turbilhão de emoções, sensações e sentimentos como poucos filmes são capazes de fazer, pelo menos não em níveis tão grandiosos.
A narrativa é um espetáculo a parte e a direção magistral de Aronofsky faz toda a diferença, sendo notável e fascinante a forma como o cineasta usa as imagens, as performances de todo o elenco e a trilha sonora para manipular as reações e sentimentos do espectador. Absolutamente tudo no filme tem um significado e uma razão para existir, sendo que absolutamente nada do que vemos na tela é leviano ou inserido a toa. Vamos começar pela cinematografia, que é utilizada para ilustrar as mudanças de personalidade da protagonista ao longa da história, criando assim duas facetas distintas: o Cisne Branco e o Cisne Negro. Notem que ao retratar o lado mais virginal, doce e inocente de Nina, a fotografia exibe cores mais alegres em cenários com conotação infantil, nesse caso o quarto dela, expondo assim a delicadeza angelical relacionada ao Cisne Branco. Porém, a medida que o Cisne Negro finalmente começa a desabrochar e ganhar forma, Nina traz a tona o seu lado mais rebelde, sensual e sem as amarras psicológicas que a prendem, o que resulta em uma fotografia com cores mais escuras e sombrias. Toda essa brincadeira visual também está presente nos momentos em que a personagem de Natalie Portman esbanja reações de alegria, tristeza, medo e surpresa. Outro ponto que merece ser muito elogiado são os excelentes planos e movimentos de câmera do diretor. Com o propósito de transmitir o máximo de realismo possível para o público, Aronofsky utiliza em demasia a câmera nas mão, como se fosse filmar um documentário. Ela anda junto a protagonista e aos demais personagens, se mantendo focada neles e registrando todas as suas reações físicas. A edição cuidadosamente bem planejada, unida ao recurso dos movimentos de câmera, traz energia e vigor para as cenas, especialmente naquelas que mostram a protagonista ensaiando ou apresentando seus movimentos de balé, criando ao mesmo tempo a sensação de calma, serenidade, tensão e alarmante grandiosidade. A magistral trilha sonora de Tchaikovski e Rasquim é trabalhada com uma grandiosidade a altura da sua importância e imponência. Criada para ilustrar a magnitude da peça ''O Lago dos Cisnes'', ela acaba se transformando na trilha sonora dos dramas e experiências da própria Nina. As demais canções compostas para o filme por Clint Mansell apresenta notas dramáticas, delicadas e intensas, encaixadas nos momentos certos no decorrer das quase duas horas de projeção.
O elenco formidável foi muito bem escalado e cai como uma luva para os seus respectivos personagens. E que personagens fascinantes. Tanto a protagonista quanto os coadjuvantes são bem escritos e com um ótimo desenvolvimento. Natalie Portman nos brinda com todo o seu talento e carisma em uma das melhores atuações da sua carreira, e olha que ela já fez muita coisa boa no cinema. Darren Aronofsky ostenta isso ao extrair o máximo da atriz, e ela dá um show. Através de um esplendido estudo de personagem, Nina é, na minha opinião, uma das melhores e mais fascinantes protagonistas do cinema atual, cheia de complexidade e camadas. E Natalie nos envolve com sua performance visceral e hipnotizante, chegando ao seu auge de excelência na brilhante sequência final, com sua apresentação de O Lago dos Cisnes, capaz de arrancar elogios e arrepios daqueles que estiverem completamente entregues e absorvidos por sua fantástica performance. Por essas e outras que o Oscar de Melhor Atriz lhe foi entregue com muita justiça e merecimento. O francês Vincent Cassel é outro que ostenta uma excelente atuação na pele do exigente professor de balé Thomas Leroy. Charmoso e manipulador, ele se mostra tão fascinante em cena quanto Natalie Portman. Mila Kunis é o oposto de Natalie em questão de personalidade, nascendo assim uma rivalidade interessante entre elas. Sua personagem é a personificação perfeita do Cisne Negro na vida de Nina, ou seja, mais ousada e com uma sensualidade mais aflorada. E de uma maneira estranhamente fascinante, ambas se completam, tanto em questão pessoal quanto metaforicamente. Isso me fez analisar e refletir sobre o quanto eu gostaria de ver essa personagem ser interpretada por Keira Knightley, devido a semelhança física que ela tem com Natalie Portman. É apenas uma observação pessoal, mas independente disso, não tem como desmerecer a atuação de Mila, já que a bela atriz está ótima no papel. Inclusive, ambas protagonizam uma cena quente e muito bem realizada, cheia de ousadia e comprometimento por parte das duas talentosas atrizes. Vele mencionar também a participação de duas grandes veteranas do cinema: Winona Ryder e Barbara Hershey. Embora com poucas cenas, as atrizes mostram do que são capaz de fazer, onde só as suas presenças já são um presente para os cinéfilos.
''Cisne Negro'' é uma obra-prima do cinema moderno. Misterioso, complexo, sexy e impressionante, é sem dúvida um dos melhores filmes da filmografia de Darren Aronofsky. É cinema de qualidade em toda a sua glória, repleto de cenas memoráveis, direção magistral e atuações de tirar o fôlego, especialmente de Natalie Portman, que merece ser exaltada pelo papel nos próximos anos. Abra o coração, a mente e os sentidos, pois muito mais do que apenas ser assistido, ''Cisne Negro'' precisa ser sentido. Contemplem o poder desse clássico moderno.
Nota: ★★★★★★★★★★ 10
CISNE NEGRO (BLACK SWAN - 2010) - Drama/Suspense, 108 minutos. DIRIGIDO POR: Darren Aronofsky. ELENCO: Natalie Portman, Mila Kunis, Vincent Cassel, Winona Ryder, Barbara Hershey, Sebastian Stan. CLASSIFICAÇÃO: 16 anos. NOTA NO ROTTEN TOMATOES: 85%
CURIOSIDADES:
- O diretor Darren Aronofsky se interessou pelo balé a partir do momento que a sua irmã estudava dança em uma renomada escola de Nova York.
- Originalmente, o diretor planejava contar a história de ''Cisne Negro'' como parte do enredo do filme ''O Lutador'' (2009) protagonizado por Mickey Rouke e dirigido pelo próprio Aronofsky. Sua intenção era inserir na história um romance entre o personagem principal e uma bailarina. No entanto, misturar o mundo das lutas com o do balé não lhe pareceu uma boa ideia, portanto, ele abandonou a ideia.
- Diversas grandes atrizes tiveram os seus nomes envolvidos no projeto. Meryl Streep foi cogitada para interpretar a mãe da personagem de Natalie Portman. Blake Lively e Eva Green chegaram a fazer testes para interpretar Lily, a bailarina rival de Nina. E para a personagem Beth Macintyre, vivida no filme por Wynona Ryder, foram considerados os nomes de Rachel Weisz e Jennifer Connely.
- Foi a própria Natalie Portman que sugeriu ao diretor Darren Aronofsky escalar Mila Kunis para atuar no filme. O diretor e a atriz tiveram uma longa conversa pela internet via Skype. Por fim, mesmo sem teste ou audição, Mila ficou com o papel da bailarina Lily.
- Ao se preparar para o papel, Natalie Portman precisou perder quase 10kg, como forma de deixa-la mais parecida possível com uma bailarina. E olha que a atriz antes do filme já estava bem magra, pesando em torno de 53kg. Ela se exercitava cinco horas por dia, de segunda a domingo, fazendo aulas de balé, cross-training e natação.
- Já Mila Kunis teve aulas com um instrutor profissional durante 3 meses como preparação para o seu papel no longa. Na sua infância, a atriz chegou a ter contato com a dança.
- Como forma de deixar a rivalidade entre as duas atrizes o mais realista possível nas telas, Darren Aronofsky tentou coloca-las uma contra a outra. Na maioria do tempo, ele mantinha uma separada da outra no set de filmagem e chegava a enviar mensagens de texto elogiando uma e a outra não, como forma de incentivar ambas a darem o melhor de si.
- ''Cisne Negro'' é quinta contribuição do compositor Clint Mansell para um filme dirigido por Darren Aronofsky. Antes disso, ele já havia criado a trilha sonora de filmes como ''Réquiem Para um Sonho'' (2000), ''Fonte da Vida''(2006), ''Pi'' (1998) e ''O Lutador'' (2008).
- Natalie Portman chegou a se machucar durante as filmagens e teve uma das costelas deslocada. No entanto, devido ao baixo orçamento da produção, nenhum médico foi contratado para atende-la. Para resolver esse problema, a atriz sugeriu que o trailer que ela usava como camarim fosse cortado do orçamento para que um médico pudesse ser contratado e ficasse no estúdio em tempo integral. A produção atendeu o pedido da atriz no dia seguinte.
- Natalie também bateu a cabeça enquanto filmava uma cena. Ela passou mal e precisou fazer uma ressonância magnética.
- Para filmar a quente cena de sexo entre as personagens de Natalie Portman e Mila Kunis, ambas sugeriram tomar alguns copos de drinques como maneira de se soltarem mais. Uma garrafa de tequila foi reservada para as duas e a produção levou um dia e meio para gravar a cena.
- Como bem sabemos, Natalie Portman ganhou o Oscar de Melhor Atriz por sua performance. Porém, o filme recebeu outras quatro indicações ao Oscar: ''Melhor Filme'', ''Melhor Diretor - Darren Aronofsky'', Melhor Fotografia e Melhor Edição.
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