Especial Charles Chaplin (1889-1977) - Análise - um dos maiores gênios da história do cinema! - PARTE 1
Por: Rudnei Ferreira
O cinema é repleto dos mais talentosos e inesquecíveis atores e diretores. Desde a criação dessa fábrica de sonhos e histórias que é a sétima arte, fomos presenteados ao longo da história pelos mais diversos talentos, em todos os anos e épocas. Porém, quando se fala de talento e cinema de qualidade, é impossível não lembrar de um dos maiores artistas que o mundo já viu. Charles Chaplin: Ator, comediante, diretor, roteirista, compositor e produtor. Um artista completo, cuja sua obra é celebrada e consagrada até os dias de hoje por fãs e admiradores do bom cinema. Clássicos marcantes, muitos deles da gloriosa época do cinema mudo, presente em várias listas dos melhores filmes de todos os tempos. Capaz de divertir o espectador com seu humor genuíno e inteligente que ao mesmo tempo misturava crítica social e drama, Chaplin é digno e merecedor de todos os elogios que se possa imaginar.
Pensando isso, hoje trago para todos os meus leitores alguns dos filmes mais incríveis e marcantes desse gênio cinematográfico. São clássicos que merecem a sua atenção para quem apreciar cinema de qualidade em toda a sua glória. Embarquem comigo nessas grandes recomendações.
TEMPOS MODERNOS (MODERN TIMES -1936) - Comédia/Drama, 86 minutos. ESCRITO, PRODUZIDO E DIRIGIDO POR: Charles Chaplin. ELENCO: Charles Chaplin, Ellen Peterson, Al Ernest Garcia, Tiny Sandford. CLASSIFICAÇÃO: Livre. NOTA NO ROTTEN TOMATOES: 100%
Carlitos (Charles Chaplin) é o operário de uma fábrica que começa a sofrer transtornos físicos e mentais por causa da abusiva jornada de trabalho que ele se submete. Determinadas circunstâncias fazem com que ele seja preso, acusado de ser um líder sindicalista, e perca o emprego. Sua vida muda quando ele conhece uma garota órfã (Paulette Goddard) e juntos passam a viver grandes aventuras e confusões com o propósito de conseguirem condições de vida melhores.
''Tempos Modernos'' é conhecido por ser o primeiro filme falado de Charles Chaplin. Na verdade, ele ainda faz parte do cinema mudo, mas alguns diálogos, mesmo que poucos, são inseridos, coisas que não vimos em outros de seus filmes anteriores. É um filme que diverte e cativa o espectador com o típico humor pastelão e inteligente de Chaplin. Só que mais do que um excelente filme de comédia, ele aborda temas comuns daquela época, mas que por incrível que pareça, são muito atuais e relevantes para os dias de hoje, como o desemprego e a crise econômica. De maneira muito inteligente, Chaplin, através do seu humor mostra as causas e consequências disso, onde muitos desempregados faziam o que podiam para sobreviver, tanto coisas ruins quanto coisas boas. Protestos trabalhistas, greves, miséria, opressão, tudo isso acontece nos dias de hoje. Claro que tudo parece pior na nossa atualidade, se formos comparar, mas é incrível como um filme rodado em 1936 pode ser tão atemporal. Isso mostra o quanto Chaplin era um visionário muito além do seu tempo.
É possível também encontrar no roteiro uma crítica social a Revolução Industrial, evento que teve início em 1760 e se estendeu até os meados de 1840, que consistia em substituir cada vez mais o trabalho braçal pelo mecanizado. Dai vem o significado do título do filme, onde vemos o mundo tendo que conviver e sobreviver a esses tempos modernos, onde a tecnologia foi ganhando contornos cada vez maiores e ocupando cada vez mais espaço. Mas Charles Chaplin ficou conhecido pelo seu talento na arte de atuar e fazer comédia e isso, ''Tempos Modernos'' trabalha com maestria. A comédia funciona de verdade, onde o riso verdadeiro é garantido, pois o humor é genuinamente divertido, com piadas bem formuladas, inteligentes e inseridas no momento certo, o que garante sequências geniais e inesquecíveis.
Além de um roteiro primoroso, que sabe trabalhar com maestria todos os seus elementos, o filme possui uma qualidade técnica maravilhosa, mesmo para os dias de hoje. Muitos efeitos práticos, alguns pioneiros do cinema, no mesmo patamar de qualidade das obras de outros geniais profissionais do período do cinema mudo como George Méliès. Chaplin dirige suas cenas e sequências com um talento absurdo. ótima movimentação de câmera, ótimos enquadramentos, uma maravilhosa montagem, trilha sonora espetacular e uma cinematografia invejável e inspiradora, com sua maravilhosa fotografia preto e branco. O charme dos letreiros que aparecem na tela revelando um diálogo dito pelos personagens é impagável.
E para coroar, temos a atuação belíssima e cheia de carisma de Chaplin, na pele do seu icônico personagem. Meigo, gentil, bondoso e encantadoramente atrapalhado, o seu talento é absurdo de tão bom. Carlitos ainda nos ensina que mesmo diante das dificuldades, a esperança e o valor da vida é uma dádiva. Ao seu lado está a bela Paulette Goddard e juntos, formam uma dupla formidável, com uma química excelente e várias sequências memoráveis, divertidas e emocionantes protagonizadas por eles. Conclusão: roteiro, direção, produção e atuações irretocáveis só poderiam resultar em um dos melhores filmes da carreira de Charles Chaplin, um dos muitos para falar a verdade.
''Tempos Modernos'' é lindo, poético, sensível, crítico e acima de tudo, muito divertido, coisa que só um gênio como Charles Chaplin poderia nos proporcionar. Mesmo com mais de 80 anos de sua existência, é um filme que surpreendentemente permanece atemporal, atual e muito relevante. Para se divertir, mas também para pensar e refletir sobre o seu conteúdo. Um dos melhores filmes de todos os tempos, assim como praticamente todos os filmes desse gênio do cinema.
Nota: ★★★★★★★★★★ 10
LUZES DA CIDADE (CITY LIGHTS - 1931) - Comédia/romance, 87 minutos. ESCRITO, PRODUZIDO E DIRIGIDO POR: Charles Chaplin. ELENCO: Charles Chaplin, Virginia Cherrill, Harry Myers, Al Ernest Garcia, Florence Lee. CLASSIFICAÇÃO: Livre. NOTA NO ROTTEN TOMATOES: 98%
Um vagabundo de rua (Charles Chaplin), em mais um dia comum em sua vida, conhece uma bela vendedora de flores cega (Virginia Cherrill) e acaba se apaixonando por ela. Ao mesmo tempo, ele conhece e se torna amigo de um homem rico (Harry Myers), o salvando e o impedindo de cometer suicídio. Quando descobre que a sua amada vendedora de flores corre o risco de ser despejada de casa por atrasar o aluguel, o homem humilde e de bom coração se passa como um milionário para sua amada para assim arrumar meios de ajudá-la financeiramente, o que acaba lhe rendendo divertidas confusões.
E chegamos aqui a um dos filmes mais lindos e mais maravilhosos da filmografia de Charles Chaplin. Enquanto ''Tempos Modernos'' é uma inteligente e divertida crítica social aos abusos cometidos pelas indústrias trabalhistas em cima de seus funcionários, ''Luzes da Cidade'' é uma encantadora comédia romântica no melhor estilo desse gênio inesquecível do cinema. Não significa que ele deixaria de abordar alguns assuntos sérios como por exemplo as diferenças de classes sociais. Enquanto uns tem tanto e gastam com escolhas egoístas, outros são muito humildes e miseráveis, porém persistem em dar o melhor de si para melhorar suas condições de vida. É interessante também como Chaplin mostra o quanto podemos se enganar e se equivocar com as imagens representadas por essas diferenças de classes. Muitos enxergam nos ricos aquela alma caridosa, porém, mesmo que tenham condições de ajudar a quem precisa, poucos realmente se importam em fazer isso. Em alguns casos, é justamente os que menos tem que estão dispostos a fazerem o bem pelo próximo sem esperar nada em troca, puramente pelo simples prazer de ajudar. Chaplin, mais uma vez com muito talento e inteligência, traz em um filme seu algo para nos fazer pensar, refletir e se comover, ao mesmo tempo que nos diverte com o seu humor.
Charles Chaplin mantém a qualidade inquestionável de sempre, com uma ótima direção, uma fotografia preto e branco linda, planos e cortes de câmera perfeitos e uma trilha sonora magistral que ilustra todas as ações na ausência de diálogos. Na verdade, ''Luzes da Cidade'' foi feito e lançado em 1931, época em que os primeiros filmes com diálogos falados já eram produzidos. Mas a relutância o ator e diretor em inserir falas em seus filmes fez com que a obra fosse inteiramente muda, e é justamente isso que torna o filme tão maravilhosamente especial pois é nos gestos, nos olhares, nos sorrisos e nas ações que o filme nos diz tudo, sem precisar dizer uma única palavra. Esse é o grande diferencial de um grande profissional que sabe o que faz.
A história é contada através de dois arcos narrativos e ambos são ótimos, pois se desenvolvem com maestria, no tempo certo e no ritmo certo, sem um atropelar o outro. E que personagens fantásticos, onde o destaque fica para o simpático vagabundo e sua amada. A química entre eles é magnífica e a relação entre ambos é linda demais. Chaplin, divertido e muito carismático e Virginia Cherrill, doce e encantadora, cuja seu comprometimento com a personagem é tão nítido que parece que de fato ela é uma jovem cega. Juntos formam um casal adorável, com momentos belos e comoventes. Ele também desenvolve uma boa parceria com o personagem de Harry Myers, onde protagonizam sequências muito divertidas. Desde a primeira cena, Chaplin nos faz gargalhas com piadas e gags visuais verdadeiramente engraçadas, como a genial luta de boxe e momentos bem tocantes, chegando ao auge em seu desfecho, que termina o filme no momento certo e faz nossos olhos se encherem de agua com sua resolução perfeita.
''Luzes da Cidade'' é exatamente assim: faz rir, pensar, refletir e se emocionar. É mais uma obra perfeita desse gênio do cinema, que ao terminar, nos faz sair com um imenso sorriso por ter assistido a algo tão bom e tão maravilhoso. Mais uma obra-prima da sétima arte e da marcante filmografia de Charles Chaplin.
Nota: ★★★★★★★★★★ 10
EM BUSCA DO OURO (THE GOLD RUSH - 1925) - Comédia/Drama/Romance, 96 minutos. ESCRITO E DIRIGIDO POR: Charles Chaplin. ELENCO: Charles Chaplin, Georgia Hale, Mack Swain, Tom Murray, Henry Bergman. CLASSIFICAÇÃO: Livre. NOTA NO ROTTEN TOMATOES: 100%
No final do século 18, Carlitos (Charles Chaplin) decide participar da chamada corrida do ouro nas regiões frias e montanhosas do Alasca. Para fugir do frio, ele acaba se hospedando em uma cabana que acaba dividindo com dois homens. Porém, um deles é dono de uma mina cheia de ouro, mas ao se esquecer do local onde ela se encontra, ele acaba pedindo a ajuda do simpático vagabundo para encontrá-la. Nessa jornada em busca de riquezas, Carlitos acaba se apaixonando por uma bela dançarina (Georgia Hale).
Na terceira recomendação que encerra essa primeira parte do especial ''Charles Chaplin'' do ''Recomendo Filmes'', temos aquele que é considerado um dos filmes mais pessoais e importantes na carreira do diretor e ator. Não que todos aqueles que compõem a sua filmografia não sejam importantes, mas o próprio Chaplin em uma declaração disse que gostaria de ser lembrado por esse filme. E mesmo que seja inferior a ''Tempos Modernos'' e ''Luzes da Cidade'', pelo menos na minha humilde opinião, ''Em busca do Ouro'' deixa explicito da primeira a última cena todo o carinho e cuidado que Charles teve com a produção, fazendo com que o filme ainda assim seja uma obra brilhante e tão glamorosa e inesquecível quanto os dois longas citados.
Chaplin está inspiradíssimo, achando o equilíbrio perfeito entre o seu típico humor inocente e pastelão e o drama, com algumas doses de romance, é claro. E como sabemos bem que o diretor adorava inserir em seus filmes temas humanos e discutíveis, ele usa o roteiro para fazer uma crítica social sobre a sociedade da época, que impunha padrões e estilos, separando as classes mais simples e de poucos recursos daqueles que eram mais bem de vida. Chaplin, com toda a sua genialidade, denuncia a miséria, o desespero e o extremo dos mais pobres, movidos pela ganância e o desejo de uma vida melhor. Tudo isso sem deixar de lado o bom humor que nos provoca risadas até hoje. Como eu disse, o enredo pode não superar os dois filmes anteriores da lista, mas ''Em Busca do Ouro'' mantém a qualidade e o nível de brilhantismo físico e narrativo do genial cineasta. Temos como resultado, mais um ótimo filme.
E como era de se imaginar, ''Em Busca do Ouro'' é um filme que está recheado de cenas marcantes e inesquecíveis, citando como breves exemplos a divertida dança dos pãezinhos, a miragem com a galinha e até o cômico e tenso momento da cabana prestes a cair. Tudo com um primor técnico maravilhoso, cuja a qualidade da cinematografia, dos efeitos práticos, da trilha sonora e dos planos e movimentos de câmera são um show a parte. Charles Chaplin demonstra total controle da situação tanto na frente quanto atrás das câmeras, sabendo muito bem o que fazer, como fazer e quando fazer. Tudo está bem encaixado e nada fica sobrando ou está fora do lugar. Simplesmente genial!
Mais uma vez dando vida ao seu famoso personagem, Charles Chaplin e seu vagabundo roubam todas as cenas, com uma naturalidade em sua atuação que impressiona. É realmente admirável como ele demonstra firmeza e boa vontade em cena. Ou seja, mais uma performance fantástica. Podemos constatar mais uma vez que mesmo sem falar uma única palavra, ele diz muito através da sua fisicalidade, olhar e sorriso. O elenco de apoio responde muito bem o imenso talento do protagonista, onde a interação entre eles resulta em momentos divertidos e emocionantes.
''Em Busca do Ouro'' é mais uma obra de arte fílmica do gênio Charles Chaplin, cujo o seu talento e capacidade para nos divertir e sensibilizar através de uma produção de qualidade se mantém impecável. O eterno vagabundo, com seu carisma, simplicidade e bom humor nos encanta mais uma vez com uma história maravilhosa.
Nota: ★★★★★★★★★ 9
CURIOSIDADES:
TEMPOS MODERNOS (1936)
- ''Tempos Modernos'' foi a despedida que Charles Chaplin fez para o personagem Carlitos, o vagabundo, já que essa foi a última vez que o ator o interpretou.
- As canções que vemos no filme foram compostas pelo próprio Chaplin.
- O filme foi considerado durante décadas o último grande filme mudo da história do cinema, até que em 2011, ele foi superado pelo filme ''O Artista''.
- ''Tempos Modernos'' foi o filme que permitiu as plateias ouvirem a voz de Charles Chaplin pela primeira vez, já que o ator sempre foi muito relutante em inserir falas e diálogos em seus filmes.
- Visionário como era, Chaplin fez de ''Tempos Modernos'' a sua visão de como ele achava que seria o futuro.
- O longa foi considerado por muitos como ousado na época do seu lançamento. Isso porque, durante uma das cenas, seu protagonista faz sem querer o uso de uma droga ilícita, neste caso o rapé, onde ele o confunde com um vidro de sal.
- Devido ao conteúdo do filme que inclui críticas a Revolução Industrial e citações ao comunismo, o filme sofreu censura em alguns países, como foi o caso da Alemanha durante o regime nazista.
- Chaplin e a atriz Paulette Goddard, que contracena com ele no filme, chegaram a ter um relacionamento amoroso na vida real e se casaram. A união entre os dois durou até 1940, quando os dois se divorciaram por causa de ciúmes e intrigas.
- Charles Chaplin, conhecido por ser extremamente exigente e perfeccionista, rodou a cena que o vagabundo compra uma flor da florista cega 342 vezes até chegar no resultado final que vemos no filme. Segundo ele, o motivo de tantas competições era para poder encontrar um modo satisfatório de mostra que a florista achava que na verdade o seu personagem era um milionário.
- Próximo do fim das gravações, o diretor chegou a demitir a atriz Virginia Cherril, a intérprete da florista cega por ela chegar atrasada no set de filmagens. Depois disso, Chaplin quis regravar todas as cenas feitas por Cherril com a atriz Georgia Hale, que já havia trabalhado com ele no filme ''Em Busca do Ouro''. Inclusive, algumas cenas com a atriz realmente foram gravadas, mas o cineasta percebeu que refazer todas as cenas de novo iria implicar em um custo adicional altíssimo no orçamento do longa. Por fim, ele recontratou a atriz anterior, que concordou em retornar as gravações com a condição de que seu salário fosse aumentado.
- Durante a estreia do filme, Chaplin assistiu o longa ao lado de ninguém menos que Albert Einstein.
- Orson Welles, diretor de ''Cidadão Kane'', tido por muitos como um dos melhores filmes da história do cinema, dizia que ''Luzes da Cidade'' era o seu filme favorito. Além dele, grandes diretores como Woody Allen e Stanley Kubrick já o aclamaram como um dos melhores filmes de todos os tempos.
- No total, 2500 homens foram contratados para interpretar os garimpeiros que vemos no filme subindo a montanha a procura de ouro. Na verdade, cada um deles eram moradores de rua que aceitaram participar do longa em troca de um dia de salário.
- A personagem Georgia, interpretada no filme pela atriz Georgia Hale, tinha sido escrita por Charles Chaplin para ser vivida por Lita Grey, a sua esposa na época. No entanto, ela teve que desistir do papel por estar grávida.
- A versão original de ''Em Busca do Ouro'' lançada no cinema era sem som. A trilha sonora foi inserida apenas no relançamento do filme em 1942 e chegou a receber uma indicação ao Oscar.
- Conta-se que em algumas sessões onde o filme foi exibido, a cena da dança dos pãezinhos era repetida mais de uma vez a pedido da plateia.
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