A Menina que Roubava Livros (2013) - Análise - Os horrores da guerra através do ponto de vista infantil!


 Por: Rudnei Ferreira 


O cinema já retratou várias vezes o caos e os horrores da guerra sob vários pontos de vista, inclusive através dos olhos de uma criança. Desde um clássico como ''A Vida é Bela'' do italiano Roberto Benigni que venceu o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro até o mais recente ''Jojo Rabbit'', elogiado filme de Taika Waititi que venceu na categoria de Melhor Roteiro Adaptado, tivemos algumas histórias cuja uma criança testemunha os males da guerra. 

Em 2005, o escritor australiano Markus Zusak lançou um livro com essa mesma pegada, ao colocar uma criança como protagonista dentro do cenário da Segunda Guerra Mundial. O livro fez muito sucesso  e se tornou um grande Best-Seller mundial. Por conta disso, Hollywood demonstrou interesse em adaptar o romance para as tela. E isso aconteceu em 2013, quando ''A menina que roubava livros'', cujo título é o mesmo do livro, chegou aos cinemas. E embora tenha recebido críticas mistas, fez um relativo sucesso entre o público que de certa forma elogiou o fato de o roteiro respeitar o material original, sendo fiel a várias passagens do livro. Confesso que não li o Best-Seller escrito por Markus Zusak, portanto, a opinião aqui descrita se remete somente ao filme, que gostei bastante e, obviamente, recomendo. 





O filme se passa na Alemanha, durante a Segunda Guerra Mundial. onde Liesel Meminger (Sophie Nélisse) perde a mãe e o irmão. Portanto, ela é obrigada a ir morar em um novo lar, onde conhece seus pais adotivos, que são de origem humilde e lutam para sobreviver durante o conturbado período em que a Alemanha, sob o comando de Hitler, estava em guerra com o mundo. Com a ajuda do seu pai adotivo Hans (Geoffrey Rush), Liesel aprende a ler e a escrever graças aos livros que ela rouba, em um período em que muitos deles eram proibidos e queimados na fogueira, além de fazer amizade com Rudy (Nico Liersch), o seu novo vizinho. Quando seus pais passam a esconder um judeu em casa, a jovem corre riscos ao lado deles para protege-lo do regime nazista. 

''A Menina que Roubava Livros'' inicia sua trama com um detalhe curioso: através de uma narração em off, sua história é contada por ninguém menos que a Morte, que perambula pelo mundo levando consigo as vidas humanas. Quando ela chega na Alemanha da Segunda Guerra Mundial, seu interesse na protagonista é o que move a trama. Assim como o livro que lhe deu origem, o filme narra o caos e o horror do conflito do ponto de vista de uma criança que perdeu muita coisa em sua vida, mesmo sendo tão jovem, e agora procura ter uma nova vida dentro desse cenário de sofrimento e tristeza, marcado por preconceito, tirania, violência e o medo que muitos tinham de sofrer graves consequências caso ousassem ser contraditórios e se opor ao regime fascista de Adolf Hitler que governou a Alemanha de 1939 a 1945. E nesse cenário, ''A Menina que Roubava Livros'' retrata o otimismo daqueles que encontram motivos para viver, se agarrando a esperança de algo bom e feliz, mesmo diante de uma realidade que parecia fazer o possível para vê-los infelizes. 





Mesmo que conte uma história ficcional, o enredo do filme narra importantes acontecimentos históricos que marcaram o período, como a chamada ''Noite dos Cristais'' que consistiu em um grande ataque realizado pelos nazistas contra o povo judeu ou a queima de livros censurados por Hitler em maio de 1933, além do próprio inicio da Segunda Guerra em 1939. A própria questão de como a população era manipulada e moldada pelo governo fascista e totalitário de Hitler, de acordo com sua vontade, fica bem clara na trama. E a história do filme faz bem em mostrar que nem todo alemão era mal e cruel, pois muitos deles eram contra o que estava acontecendo no período. Tem aqueles que alegam que o filme pegou leve com uma trama que retrata o sombrio período da guerra, mas honestamente falando, ele sabe transmitir a sua mensagem sem apelar para nada muito gráfico e visualmente chocante. Só a ideia e a sugestão de determinado acontecimento é mais do que suficiente para nos deixar pensativos e reflexivos sobre o seu conteúdo. E para quem conhece um mínimo sobre o que foi a Segunda Guerra Mundial, entende muito bem quais foram as causas e consequências de algumas situações que o roteiro apenas sugere. Ou seja, as vezes, sugerir ao invés de deixar explicito pode causar muito mais impacto. Sim, o filme é bem mais leve do que deveria ser por causa do seu tema, mas funciona com essa proposta. 

Em questões de produção, o filme é simples, se for comparar com outras obras que possuem a mesma temática, mas é honesto e bem realizado. A cinematografia faz um bom trabalho em retratar a época, com uma boa direção de arte e locações bem escolhidas. O filme tem um bom ritmo, com uma história bem fluida e uma narrativa imersiva que prende o espectador, resultado da direção correta de Brian Percival. Os personagens, pelo menos os principais, trazem um bom desenvolvimento e convencem nas suas características e motivações, especialmente a protagonista. Alguns outros não recebem o mesmo tratamento, servindo apenas como mais um detalhe no enredo. A trilha sonora do mestre John Williams transmite através do seu tom os vários sentimentos e sensações que fazem parte da trama. Mesmo que possua muita sensibilidade ao contar sua história, o filme é daqueles que nos deixa mais pensativos do que emocionados. Porém, o seu desfecho pode dar um nó na garganta. Não digo que vai acontecer com todos que assistir o filme, mas comigo aconteceu. 





O elenco é fortíssimo e conta com atuações muito significativas e de qualidade. A jovem Sophie Nélisse está encantadora como uma criança que procura manter a sua inocência e pureza, mesmo em um cenário marcado pela dor e o ódio. Por ser uma boa protagonista, conforme suas características e condições são exploradas e estabelecidas, acompanhar a sua jornada se torna muito fácil, graças a presença e o carisma da atriz. O veterano Geoffrey Rush encanta ao compor um personagem gentil, simpático, acolhedor e muito bondoso em suas atitudes. É mais um entre tantos trabalhos admiráveis do ator. Emily Watson convence como uma mulher dura, fria e amargurada, mas por trás das suas atitudes, ela esconde um bom coração. Começamos a história sentindo antipatia por ela, mas conforme a trama avança, esse sentimento muda completamente para melhor em relação a ela. Ben Schnetzer traz um personagem misterioso, mas igualmente bondoso e interessante, o que torna fácil de se solidarizar e se importar com ele e sua condição. O jovem Nico Liersch, mesmo com poucas cenas, desperta um bom sentimento no público, sendo interessante de ver a amizade que nasce entre ele e a protagonista. E por último, vale destacar a boa narração de Roger Allan ao emprestar sua voz serena para uma versão sentimental, contemplativa e poética da Morte. 

''A Menina que Roubava Livros'' pode ter uma visão mais suavizada do período da guerra, mas ainda assim, é tocante e cheio de momentos muito bonitos, tanto visual quanto narrativo. Mais do que isso, é reflexivo, com um tom filosófico e otimista de uma realidade que infelizmente existiu. Sem contar que o incentivo a leitura que o enredo traz é maravilhoso e muito válido, afinal, uma boa leitura pode salvar vidas, tanto física quanto mental, nos libertando da ignorância e enriquecendo com o mágico prazer do conhecimento. Tudo isso é embalado pelo poder da inocência e da pureza de uma criança, algo praticamente raro de se ver nos dias de hoje. Como filme, vale muito a pena conferir, o que talvez desperte o interesse de muitos para ler o livro que deu origem a essa boa produção cinematográfica.

Nota: ★★★★★★★★ 8



A MENINA QUE ROUBAVA LIVROS (THE BOOK THIEF - 2013) - Drama, 131 minutos. DIREÇÃO: Brian Percival. ELENCO: Sophie Nélisse, Geoffrey Rush, Emily Wattson, Nico Liersch, Ben Schnetzer, Roger Allan. CLASSIFICAÇÃO: 10 anos. NOTA NO ROTTEN TOMATOES: 47%


CURIOSIDADES: 

* A Fox tinha os direitos de adaptar o livro de Markus Zusak para o cinema desde 2006. Mas só conseguiram trazer o filme para as telas em 2013. 

* Antes de dirigir a adaptação, o diretor Brian Percival já havia trabalhado em alguns episódios da série ''Dowton Abbey''. 

* O filme foi indicado ao Oscar na categoria de Melhor Trilha Sonora, sendo que essa foi a 49° vez que o compositor John Williams foi indicado ao prêmio. 


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