LARANJA MECÂNICA (1971) - ANÁLISE - UMA OBRA-PRIMA DE STANLEY KUBRICK!




 Por: Rudnei Ferreira


Stanley Kubrick foi um gênio do cinema. Um cineasta revolucionário, muito além do seu tempo, foi o responsável por algumas das obras cinematográficas mais importantes e marcantes do cinema. Só para citar alguns exemplos temos ''Spartacus'' (1960), ''Glória feita de sangue'' (1957), ''Nascido para matar'' (1987), ''Dr. Fantástico'' (1964), ''O iluminado'' (1980), ''2001: Uma odisseia no espaço'' (1968) e ''De olhos bem fechados (1999). Ao longo de sua brilhante carreira como diretor, Kubrick foi versátil, trabalhando com quase todos os gêneros cinematográficos e deixando pelo menos um filme marcante em cada um deles até a sua morte em 1999. 

Dentre todas essas obras de arte, uma se destaca como um dos longas mais polêmicos, mas também um dos mais brilhantes do diretor. ''Laranja Mecânica'' é um filme que veio para quebrar barreiras desde a sua estreia, resultando em um longa que não é para todos, mas sem dúvida, é uma das obras-primas do diretor. E fez por onde merecer esse status. 







O filme se passa em um futuro não tão distante onde uma gangue de jovens delinquentes liderados pelo sádico e violento Alex DeLarge (Malcolm McDowell)  anda pelas ruas de Londres se divertindo as custas da tragédia e do sofrimento propagados por aquilo que eles alto denominam ''Ultraviolência'', resultando em algo desagradável para suas vítimas, unicamente para sua diversão. Porém, durante mais uma de suas arruaças, Alex é traído e preso. Com a intenção de ganhar a liberdade o mais rápido possível, o jovem concorda em se voluntariar para participar de um controverso e polêmico programa de reabilitação, onde o paciente é forçado a criar completa aversão a violência. Porém, depois de tanto tempo praticando o mal e supostamente curado de sua natureza violenta, é a vez de Alex provar do seu próprio remédio e das consequências do seus atos. 




 


''Laranja mecânica'' possui um dos roteiros mais bem feitos e inteligentes do cinema. Baseado no livro escrito em 1962 por Anthony Burgess, o longa aborda temas como o comportamento humano e sua natureza feroz e violenta e também as causas e consequências de nossas ações e até que ponto temos o direito ao nosso livre arbítrio e quando isso pode ser tirado de nós.  É um filme onde a música, as cores, as imagens e os diálogos são muito importantes. Nada do que vemos em cena está lá a toa. Tudo tem seu significado, contribuindo de forma significativa para a história. Metafórico e alegórico, o roteiro exige comprometimento do espectador e praticamente todos os elementos audiovisuais geram reflexões e análises sobre seu conteúdo. 

Tamanho impacto desse conteúdo fez com que o filme causasse controvérsias e polêmicas pelo mundo todo. Mas o longa esta longe de ser apenas um filme violento e com forte carga sexual. O roteiro se mostra muito atual e relevante até para os dias de hoje, mexendo com nossos sentimentos e emoções com a mensagem que ele quer nos passar. Mesmo se tratando de uma história ficcional, fica impossível não comparar suas ações com o que vemos diariamente ao nosso redor. Afinal, muitas das ações vistas em cena são um retrato da nossa atualidade. Isso mostra o quanto Kubrick foi visionário com sua visão animalista da natureza humana, mesmo quase 50 anos depois do lançamento de ''Laranja Mecânica''. E toda a polêmica envolvendo o conteúdo pesado do filme nos faz pensar em como somos hipócritas. Afinal, o filme de Kubrick nada mais é do que a realidade nua e crua e não adianta fechar os olhos para essa realidade. E o diretor nos apresenta tudo isso com um olhar fortemente crítico. Sua intenção não é incentivar o glorificar o que está exibindo em cena. Muito pelo contrário. Ele quer nos mostrar o quanto tais acontecimentos são inaceitáveis e errados, para que jamais sejam repetidos ou imitados. Claro que infelizmente, não é o que acontece sempre. Mas para bom entendedor, a mensagem do genial cineasta fica bem clara. 




   


É possível ainda encontrar no roteiro de ''Laranja mecânica'' uma crítica à maneira como nos é apresentado determinadas realidades. As vezes, a verdade que nos é mostrada nem sempre é a verdade absoluta. Ela apenas é induzida de acordo com a vontade daqueles que a conta. Isso fica mais do que claro especialmente nos minutos finais do filme, o que nos faz pensar em como a maioria das pessoas aceitam tudo o que é imposto a elas, mesmo que, por trás de tudo, exista uma outra verdade bem diferente. É Kubrick, com toda sua genialidade, sendo mais uma vez crítico em relação a uma verdade que poucos querem enxergar. Juntando tudo isso, em um ritmo pontual e perfeito, Stanley Kubrick narra sua história em uma narrativa muito bem equilibrada no drama, na comédia, na música e na crítica social, onde nada é apelativo ou exagerado. Como citei nas linhas mais acima, tudo tem seu propósito para ser e acontecer em cena, e o diretor faz isso brilhantemente!







Tecnicamente, ''Laranja mecânica'' se mostra tão genial quanto seu roteiro. Kubrick, com seu estilo único presente na maioria de suas obras cinematográficas, opta por poucos cortes de câmera. O diretor traz leves movimentações e gosta de deixar sua câmera o mais quieta possível, parada, focada o máximo que pode nos personagens, nas suas ações e nos ambientes. Claro que ele escolhe os momentos certos para utilizar seus planos de câmera e quando precisa cortar, faz isso de maneira bem pensada, mostrando somente o necessário para compor determinados acontecimentos. A câmera lenta também é bem utilizada em uma cena que mescla o violento e o tom cômico. 

O sexo possui muita relevância e presença no filme, seja na iconografia dos elementos presentes nos cenários quanto nas cenas envolvendo o próprio ato sexual ou com a nudez apresentada. O roteiro trabalha de maneira perfeita a temática e com um propósito convincente para acontecer. E é nesses momentos que o estilo de filmar do diretor chama a atenção, com os planos de câmera citados acima cumprindo seu papel. Só a simples ideia do que é exibido em cena já deixa suas intenções bem claras. E mais uma vez vemos a sensibilidade do diretor que também tem algo a contar com esses acontecimentos. E acredite, tem muita importância. 

Outros elementos como a iluminação, os cenários e os figurinos fazem um belíssimo contraste com as cores fortes e psicodélicas da fotografia. A montagem é perfeita, com transições visuais bem legais. A trilha sonora perfeita, com música clássica que vão desde Beethoven a ''Sing in the rain'' ilustra momentos inesperados e improváveis, mas que funcionam pela ousadia e coragem desses momentos. 





 


Alex, o protagonista interpretado com muito talento e competência por Malcolm McDowell é provavelmente um dos personagens mais interessantes e bem escritos do cinema. Mesmo se tratando de um psicopata, ele possui carisma e presença em cena. Além de protagonizar, ele é o narrador da história e dos acontecimentos e seu tom manipulativo nos convida a acompanhá-lo em sua jornada, e é uma jornada tão interessante que fica impossível não querer acompanhá-la até o fim. Não entenda mal. É possível curtir o personagem não pelos seus atos cruéis, polêmicos e condenáveis, mas sim porque ele é um personagem muito bem feito e bem desenvolvido. Juntando isso ao inquestionável talento do ator temos um dos vilões mais marcantes e icônicos do cinema. Seus diálogos são memoráveis, com uma mistura de dialetos e palavras que podem causar estranhamento no início, mas que se tornam marcantes na composição do protagonista

O elenco de apoio está muito bem e corresponde a grande performance do personagem principal e seu intérprete. Destaque para a atuação extremamente carregada de sentimentos de Patrick Magge, onde o ator transpõe para a tela toda a amargura e angústia de seu personagem somente através do seu olhar e das suas expressões faciais. A questão em torno do controverso tratamento pelo qual Alex é submetido gera algumas discussões sobre como tal método poderia ser usado na nossa realidade e o quanto ele seria eficaz contra aqueles que causam mal e sofrimento a sociedade. É algo interessante a se analisar e, assim como no filme, iria gerar reações variadas, principalmente por conta da questão do livre arbítrio.  







''Laranja mecânica'' é uma experiência audiovisual musical, violenta, chocante, complexa, polêmica, divertida e absolutamente brilhante sobre o retrato da sociedade e da condição humana. É um filme muito além do seu tempo, que envelheceu absurdamente bem e se mantém atual e muito relevante mesmo para os padrões de hoje. Uma obra-prima profunda e reflexiva, escrita e dirigida por um dos melhores diretores que o cinema já viu. Para quem tiver a coragem de se aprofundar em seu conteúdo, irá encontrar algo absolutamente fascinante e inesquecível. 

Nota: ★★★★★★★★★★ 10




LARANJA MECÂNICA (A CLOCKWORK ORANGE - 1971) - Drama/Ficção Científica, 136 Minutos. / ROTEIRO, PRODUÇÃO E DIREÇÃO: Stanley Kubrick. - ELENCO: Malcolm McDowell, Adrienne Corri, Patrick Magee, Warren Clark, Miriam Karlin. CLASSIFICAÇÃO: 18 Anos. 











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